2. Design no
Século XIX
2.1 O Design Vitoriano 1835 a 1903
A Rainha Vitória (1837-1907) da
Grã Bretanha marcou uma era muito importante para a cultura inglesa: a Era
Vitoriana. No seu reinado as artes, as ciências e a tecnologia foram
desenvolvidas em um espaço de tensão entre a tradição do passado e a
modernidade. O estilo vitoriano, do qual os ingleses se orgulharam, se
estendia aos objetos, móveis,
roupa, tecidos, gráfica, arte, arquitetura, paisagismo e design de
interiores. Sua influencia chegou a muitos outros continentes e durou mais
de um século.

Ambientes vitorianos
O pensamento de John Ruskin
(1819-1900), crítico de arte e medievalista, as obras de A.W. Pugin
(1812-1852) arquiteto e designer e de William Morris (1834-1896) tiveram uma
grande influencia sobre o design vitoriano. Todos eles proclamaram a importância
da relação entre arquitetura e design que existia na cultura clássica
greco-romana e medieval. Este saudosismo de tempos passados, era parte da
cultura romântica da época, mas também revelava o medo do presente e do
futuro cada vez mais tomado pelas máquinas de ferro.
A sociedade industrial era
orgulhosa do progresso material que trazia a Revolução Industrial. Mas
muitos pensavam que este progresso material deixava de lado as preocupações
espirituais e que assim ameaçava o tecido social. Ruskin encontrava na arte
a possibilidade de devolver o equilíbrio entre o progresso material e
espiritual. Ele escreveu muitos livros de história e crítica de arte que o
gosto vitoriano encontrava moralmente edificante. Estes livros instruíram á
classe média britânica na idéia da arte como reflexo das condições morais de
uma sociedade: "o sinal visível da virtude nacional".(EFLAND, A., 1990).
Ruskin via a arte como a imitação
da natureza, além disto devia proporcionar também prazer. Mas aquilo que
tornava um objeto em uma obra de arte era o propósito moral: a maior
quantidade de grandes idéias. Para Ruskin as obras de arte são encontros com
as grandes idéias. Por causa disto ele defendia a importância de viver em
ambientes altamente estéticos.

Sala medieval organizada por
A.W. Pugin, Exposição Universal de 1851, Londres
O arquiteto Pugin levou as idéias
de Ruskin ao plano do design. Como Ruskin, Pugin propunha um design
baseado na utopia regressiva do retorno à beleza da natureza, em
oposição ás novas tendências que exaltavam a beleza das máquinas. Eles
sentiam aversão pelas tendências arquitetônicas marcadas pelo Palácio de
Cristal. Para Ruskin e Pugin a beleza devia expressar uma função
social: "só pode ser belo aquilo que é bom", esta era uma idéia medieval
que explicava a beleza como a materialização do bem. (ECO, U.2007)
Nas artes, o movimento
Pré-rafaelista, que tentava retornar á simplicidade e sinceridade
da arte foi o que melhor representou a estética e moral vitoriana.
O gosto vitoriano cresceu no
coração da burguesia britânica do século XIX. Na arquitetura, na decoração,
no paisagismo e nas artes gráficas e nos objetos predominaram as formas
orgânicas estilizadas de linhas marcadas e os arabescos
com decoração austera e volumes geométricos.


A diferença entre a locomotiva inglesa e a
norte-americana é a diferença entre esconder as formas da máquina ou
evidenciá-las.
2.2. O movimento Arts and
Crafts

William Morris, design gráfico para livro
Assim como para Ruskin e
Pugin, para William Morris o retorno ao sistema dos grêmios da Idade Média e
o retorno à vida em contato com a natureza eram as únicas saídas da
alienação das metrópoles, da fria e artificiosa beleza do ferro, da produção
industrial em série e da miséria causada pela exploração e pelo trabalho
mecanizado das fábricas (ECO, 2007).
Movido por estas idéias iniciou o
movimento Arts and Crafts (Artes e Ofícios) e fundou em 1861 junto ao
arquiteto Philiph Webb e outros associados, um estúdio de design com o
propósito de restabelecer os laços entre o trabalho belo e o trabalhador e
voltar á honestidade do design que a produção em massa negava. O estúdio de
Morris e Webb ficou conhecido pela idéia da casa como uma obra de arte
total, com todos os objetos desenhados pelos arquitetos e realizados por
artesãos experientes usando métodos tradicionais e se inspirando na
natureza.

Charles F. Annesley Voysey
O design do movimento Arts and
Crafts se caracterizou pela:
-
simplicidade vs. complexidade no
ornamento
-
sistema de grêmios vs. sistema
industrial
-
acabado artesanal vs. acabado
industrial
A missão social do movimento era
dar solução aos males da Revolução Industrial: melhorar a
qualidade de vida dos trabalhadores, levar a cultura a todos e restabelecer
a união das artes e os ofícios perdida desde o Renascimento.
Todas as peças feitas nos estúdios
do Arts and Crafts seguiam os princípios estabelecidos por Morris:
-
considerar o material (qualidade e
nobreza)
-
considerar o uso (função)
-
considerar a construção (design)
-
considerar a ferramenta (técnica)


Charles Robert Ashbee
O movimento Arts anda Crafts de Morris teve o apóio da monarquia vitoriana e
teve grande sucesso entre a burguesia rica. A marca registrada da oficina de
Morris e arquitetos era a alta qualidade artesanal dos produtos. Isto
encarecia muito os objetos frente àqueles que produziam as fábricas. O sonho
de Morris de oferecer ambientes e objetos altamente estéticos a todos não
era possível. Só os ricos podiam comprá-los. Mas o gosto pelos objetos Arts
and Crafts cresceu e se estendeu na Alemanha e nos Estados Unidos onde se
publicaram revistas especializadas que atingiam um grande público feminino.

Design de interiores 1884
para a revista Arts and Crafts de Munich,Alemanha
Catalogo de cadeiras Thonet
As idéias do movimento Arts and Crafts, os ventos românticos e a veloz
modernização da Europa no final do século XIX inspiraram na França um
movimento ainda maior e mais abrangente.
2.3. O Modernismo ou Art Nouveau 1890 - 1918

Cartazes: Toulouse Lautrec para jane Avril e
Alphonse Mucha para cigarros JOB
O movimento do Art Nouveau se
iniciou na França e se expandiu por toda a Europa convertendo-se em um
estilo internacional. Em inglês se conheceu como Modern
Style, em espanhol e português como Modernismo, em alemão como Jugenstil e
em italiano como Liberty ou Estilo Floreale.
Este movimento esta estreitamente
ligado às correntes artísticas de fim de século que promoveram a imaginação,
a expressão e o simbolismo na arte, mas também à produção industrial em
série e ao uso de materiais modernos como o ferro, vidro e cimento. À
diferença do movimento Arts and Crafts, o movimento francês do Art Nouveau
valorizava
a racionalidade da ciência e da engenharia e acompanhava o crescimento da
burguesia. Era uma nova geração que tinha nascido e crescido nas
metrópoles. Desta maneira o Art Nouveau estabeleceu uma articulação estreita entre arte e indústria
resultando numa
alta qualidade estética dos objetos.
O Art Nouveau foi o primeiro
fenômeno de moda em que as tendências da arte era aplicadas aos objetos. Moderno significa novo, atual. A moda é uma novidade que
toma conta de todos os aspectos da vida. Isto foi possível no contexto de
uma sociedade que já contava com uma rápida propagação das idéias e os
costumes pelos meios de transporte e comunicação e que contava com um
mercado entusiasmado pelo consumo das novidades modernas.

As linhas curvas, os arabescos, as formas orgânicas e geométricas e os
motivos florais que caracterizaram o estilo do movimento Arts and Crafts se
fizeram mais atrevidas e sensuais no Art Nouveau. Arquitetura,
móveis, objetos, jóias, roupa, máquinas, móveis urbanos, tudo se vestiu de
linhas onduladas como as entradas do Metrô de Paris de Henry Guimard
ou o Parque Guell de Gaudi. Era uma geração que aceitava a máquina, mas a vestia de
adornos floridos para naturalizá-la. A máquina de costura Singer, que
foi uma das peças mais vendidas na história do comércio e que até hoje
funcionam em alguns cantos domésticos do mundo, são a evidencia do desejo de
esconder a frieza do ferro e das máquinas com formas e ornamentos que
lembravam a natureza. Era a forma que os modernistas tinham encontrado para
aceitar o peso da civilização industrial e que os idealistas ingleses do Arts and Crafts recusavam assimilar.

Máquina de costura SINGER e publicidade
Sendo uma continuação do movimento inglês, compartilhou muitas das
características estilísticas, mas devido a sua visão otimista do progresso
moderno e á sua ligação com a corrente artística do Simbolismo o movimento
Art Nouveau foi muito mais sensual e alegre, muito mais glamoroso
e atrevido, muito menos preocupada com o sentido moral e mais com o
sentido estético e tecnológico. Enquanto o movimento do Arts and Crafts
era idealista, o Art Nouveau era positivista.
Estas são suas características estilísticas:
Do movimento participaram arquitetos como o espanhol Gaudi, o artista
francês Henry Tolouse Lautrec, o designer gráfico e artista inglês Aubrey
Beardslay, o arquiteto inglês Machmurdo, o arquiteto belga Victor Horta, o
artista austríaco Gustave Klimt, o designer gráfico checo Alphonse Mucha e o
francês Jules Cheréte junto a muitos outros mais.

Gustave Klimt, "Hygieia"
1907 , Aubrey Beardsley "O mando do Pavão" 1894
Houve um grande desenvolvimento do design gráfico com o surgimento dos
cartazes coloridos, que agora eram possíveis com a
litografia (gravura
com matriz de pedra). A vida noturna, boêmia, artística e consumista das
metrópoles exigia por primeira vez uma imensa produção de publicidade
e propaganda. Os desenhos eram feitos à mão e a fotografia era usada como
base do desenho realista e decorativo. A tipografia seguia uma
expressividade manual que lhes deu uma visualidade muito audaz e
moderna.

Tolouse Lautrec e Edward Penfield
O nome de Belle Èpoque corresponde a uma época de grande otimismo no futuro
da civilização. Uma onda positiva que deu origem ao pensamento
Positivista na filosofia de ocidente (ver também
materialismo, evolucionismo, marxismo e determinismo na
filosofia) e na perspectiva dos que desfrutavam dos prazeres e luxos da
modernidade. Mas o que acontecia nas ruas pobres de Paris e de outras
metrópoles européias estava longe de ser uma bela época, a situação iria
detonar em poucos anos as certezas da razão que na época se encontrava na
ciência, nas máquinas e no sistema de produção capitalista. O Art Nouveau
foi um sucesso enquanto durou a Belle Époque mas se restringia às ruas dos
bairros ricos e ao consumo da burguesia ascendente. Na virada do século com
a iminência de uma guerra de grandes proporções o movimento diminuiu a sua
força. Com a Primeira Guerra Mundial o movimento se centrou nos Estados
Unidos e nos anos 20 derivou no estilo decorativo chamado Art Deco.
No Brasil a arquitetura e os objetos Art Nouveau ou Modernistas chegaram no
começo do século XX com as muitas novidades modernas de Ocidente. Em São
Paulo, Rio de Janeiro e Manaus se levantaram obras arquitetônicas das quais
só restam algumas como a casa Vila Penteado desenhada por Carlos Eckman e
que agora é a Faculdade de Arquitetura e Urbanismo da Universidade de São
Paulo.

Vila Penteado São Paulo e casa Vilino Silveira
O movimento artístico Modernista da Semana de 22 não faz parte desta
influencia. Ela tem origem nas correntes artísticas da segunda década do
século XX. Embora originadas no Art Nouveau ou Modernismo a Arte Moderna do
seguinte século difere em propósito e estética daquela que floresceu na
Belle Èpoque.
‘A jovem indústria européia, à procura de uma
estética complacente e complacida, encontra no Modernismo
uma forma de representação orgânica que desde a arquitetura
ao livro, do mobiliário à joalheria, dos objetos de uso
cotidiano à escultura decorativa ou ao cartaz, proporciona
uma resposta plástica coerente e amável, à exata e precisa
medida das suas ambições pequeno-burguesas”. (tradução
minha)
"El diseño gráfico, desde los orígenes hasta
nuestros días", por Enric Satué
Image and Art " del Arts and Crfts ao Werkbund Institute
Fontes:
BURDEK, Bernhard E. Diseño:
Historia, teoría y práctica del diseño industrial. Barcelona: Gustavo
Gili, 1994..
ARGAN, Giulio
Carlo. Historia da Arte Moderna, do Iluminismo aos Movimentos
Contemporâneos Companhia das Letras, São Paulo, 1992.
ECO, Umberto. História de la Belleza.
Barcelona: Editora Lumen. 2007.


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